Município sede de reserva indígena fica com 74% das vacinas destinadas à microrregião de Januária

 

Prefeito Jair Xakriabá, de máscara preta e já imunizado, discursa na tenda montada para receber as primeiras doses da vacina contra a covid-19

O município de São João das Missões, no extremo Norte de Minas, ficou com 73,6% das 14.080 doses da vacina Coronavac distribuídas esta semana pelo Governo de Minas para os 25 municípios sob jurisdição da Gerência Regional de Saúde de Januária.

O município, que é sede da reserva indígena Xakriabás, recebeu uma primeira tranche de 5.186 doses da vacina e deverá receber a mesma quantidade daqui a duas semanas.   

Segundo a GRS Januária, a população residente nos 25 municípios é de 406 mil habitantes. A distribuição de quase 75% das doses para apenas um município da microrregião gerou muita insatisfação entre os secretários de saúde - que esperavam uma divisão mais equânime do imunizante, mesmo respeitadas as prioridades estabelecidas pelo governo estadual.

Com população estimada de 13 mil pessoas (70% delas de remanescentes da etnia indígena Xakriabás), São João das Missões ficou, sozinho, com três quartos do total de doses da vacina contra a covid-19 e deverá vacinar cerca de 20% dos seus habitantes - um luxo, quando se considera que a média de pessoas vacinadas no país durante esta primeira etapa de imunização não deverá chegar a 3%.

PRIVILÉGIO

Ciente do privilégio que as circunstâncias e os critérios de repartição das doses da Coronavac lhe concederam, o prefeito Jair Cavalcante Barbosa, o Jair Xakriabá (PSD), montou uma tenda com balões em azul e branco em praça pública para bater-bumbo no lançamento da campanha de vacinação no âmbito local na tarde da terça-feira (19).

Para se ter ideia da disparidade na distribuição das vacinas, o município de Itacarambi, ali do lado, recebeu apenas 36 doses da vacina nessa primeira leva. 

Na divisa oposta, Manga, com população de 18,4 mil habitantes, ficou com apenas 180 doses - suficientes para a cobertura de 90 pessoas, já que a vacina chinesa demanda duas aplicações para que tenha eficácia garantida em 50,4% dos casos. 

SUA PARTE NESSE LATIFÚNDIO

Brasília de Minas foi contemplada com o segundo maior número de doses (535), seguida por São Francisco (380) e Januária (262). Os municípios de Campo Azul e Patis receberam apenas 13 doses da Coronavac cada um. Ibiracatu, Juvenília e Pintópolis tiveram direito a 15 aplicações. 

“Nosso município vive um momento histórico. Tivemos o privilégio de receber um número maior de doses, porque temos pessoas de alto risco, inclusive os 70% dos indígenas que se enquadram nesse critério”, discursou Jair em vídeo distribuído nas redes sociais.

Jair Xakriabá foi uma das primeiras pessoas a se imunizar em São João das Missões, prerrogativa que a condição de inídigena lhe confere. A fila de prioridade inclui ainda profissionais de saúde na linha de frente do combate à covid, além dos idosos em situação de asilo.

O prefeito quer aplicar as cinco mil doses do imunizante e recomendou, duranta sua fala na cerimônia de lançamento da campanha de vacinação, à população local para que não se deixe levar pelas campanhas anti-vacina que circulam nas redes sociais.

NÃO GOSTEI

 

Tudo medido e pesado, o day-after da distribuição da vacina chinesa que o presidente Bolsonaro jurou que jamais compraria já causa grande frustração entre os prefeitos que se mobilizaram para receber seus quinhões do imunizante.

As doses disponíveis até aqui não são suficientes para imunizar sequer os profissionais de saúde em atuação no país. No caso da microrregião de Januária, há muitas queixas de prefeitos - desde que o site se comprometa a não identificar seus nomes - com o tratamento privilegiado dado à reserva Xakriabá.

Sobre a condição de anonimato, um prefeito da microrregião disse que está quebrando a cabeça para dividir as poucas doses que recebeu entre aqueles grupos que a Secretaria Estadual de Saúde definiu como prioritários. Há casos de municípios que receberam vacina suficiente para imunizar apenas 13 pessoas.

NÃO DÁ PARA O COMEÇO

Procurada, a Gerência Regional de Saúde não respondeu ao pedido de informação sobre que critérios utilizou para repartir as 14 mil doses da Coronavac recebidas com pompa e circunstância pelo prefeito de Januária, Maurício Almeida (PP), na manhã da terça-feira no aeroporto de Januária.

O prefeito Almeida amanheceu no aeroporto para ajudar a descer as caixas térmicas do avião militar que levou a vacina até o município - e, claro, pousar para as fotos que varreram as redes sociais ao longo do dia.


Apesar de contar com 17,5% da população total da jurisdição da GRS Januária, o prefeito Maurício recebeu apenas 260 doses da vacina Coronavac - com esse volume ele não consegue imunizar sequer o pessoal da saúde local.   

Segundo uma fonte, caso a GRS tivesse seguido o critério do tamanho da população de cada município após analisar os grupos prioritários de idosos institucionalizados, profissionais de saúde na linha de frente do enfrentamento à covid, além do pessoal da atenção básica à saúde, mais os casos de atendimento preferencial a indígenas e quilombolas, os números seriam outros.

FONTE: jornalista Luis Claudio Guedes

 

 

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